Inflexões Avenses

domingo, fevereiro 28, 2010

Inflexões (publicadas a 25 de Fevereiro)

O essencial e o acessório: Portugal vive anestesiado. Diria mesmo sedado, perante o que tem vindo diariamente à praça pública. Os problemas de desemprego, os problemas económicos, a dívida pública, a credibilidade externa do nosso país ou a falta dela, a criminalidade... São muitos os problemas que Portugal enfrenta mas estão relegados para segundo ou mesmo terceiro planos. O que está no centro das atenções: escutas. Escutas telefónicas que um juiz diz que são graves, mas que afirma nada ter de relevante. Temos violações do segredo de justiça que existe apenas no papel. Costuma dizer-se que o fruto proibido é o mais apetecido, por isso se o segredo deixar de ser segredo talvez ninguém o procure. Sei que este escrito é uma divagação mais ou menos inconsequente, mas vai ao ritmo da anestesia e do sedativo que todos padecemos. Indo ao cerne da questão, há muita gente a duvidar do carácter e da conduta de José Sócrates como primeiro-ministro. Poderá haver inúmeras matérias em que discordo dele e das decisões que tomou. Em inúmeros aspectos foi mesmo uma desilusão. Mas, sinceramente, olho para o lado e nada vejo capaz de ser uma alternativa. Mesmo assim, poderíamos ter o Presidente da República a dizer basta e a demitir Sócrates ou a dissolver a Assembleia da República. Más há aspectos legais que condicionam uma atitude de força de Cavaco Silva, refém do calendário eleitoral passado e do que brevemente irá iniciar-se. A corrida a Belém está longe de ser um passeio para Cavaco Silva e qualquer decisão mais ousada poderá influenciar o voto dos portugueses nas presidenciais. Olhando para o lado vemos o PSD ainda a mais de um mês de distância de ter a casa arrumada e a ver vamos se fica mesmo arrumada e se o partido fica preparado para disputar eleições. Quanto aos restantes partidos à esquerda e à direita, pouco ou nada de novo e diferente poderemos esperar. O problema é que esta situação desgasta e poderá chegar a uma posição de não retorno e poderemos ter mesmo de ir para eleições. E aí serão mais uns meses de folhetim político e de inactividade governativa. Estamos reféns de uma classe política medíocre, da esquerda à direita, que pensa apenas nos seus interesses e não nos do país. Face à situação económica e social do país necessitávamos de um pacto de regime e não de querelas e disputas mesquinhas. Infelizmente é o que eu penso e acredito que o mesmo pensam muitos outros portugueses, mas nós não temos voz.

Fases: No nosso concelho de Santo Tirso e em muitos outros por esse país fora, quase tudo se faz por fases. Quase todas as obras têm uma, duas e até três fases. Lança-se uma ideia, anuncia-se a ideia e diz-se: “em breve vai nascer isto” e passam-se anos. Depois lança-se o projecto e anuncia-se o projecto e diz-se: “em breve vai nascer isto” e passam-se anos. De seguida lança-se o concurso público e anuncia-se o concurso e diz-se: “em breve vai nascer isto”. Quando o processo parece estar à beira do fim anuncia-se o arranque da obra e diz-se: “em breve vai nascer isto” e passam-se mais uns anos. Mais tarde anuncia-se a conclusão da primeira fase da obra e anuncia-se a segunda e diz-se: “em breve vai nascer isto” e passa mais algum tempo até que finalmente seja inaugurada e posta ao serviço dos munícipes. A esta altura o leitor deverá estar a pensar: “que exagero”. Poderá até ser, poderá até haver vários casos em que o processo foi muito mais rápido. Mas posso referir alguns casos em que aconteceu exactamente como descrevi: o Centro Cultural de Vila das Aves será um bom exemplo. O parque da quinta do Verdeal é outro e esse ainda nem em obra entrou. A avenida de Paradela até Cense é outro caso. Antes das eleições, quando foi anunciada a obra e a empreitada arrancou acreditei que por esta altura já haveria alcatrão ou paralelo nessa importante artéria, mas não, apenas está feita a primeira fase. É assim...

sábado, fevereiro 20, 2010

Inflexões (publicadas a 28 de Janeiro)

Nota prévia: a publicação deste texto com quase um mês de atraso pode causar estranheza em inúmeros visitantes, mas a vida nem sempre se compadece com actualizações de blogues. Aos meus seguidores um pedido de desculpas.

Vítor Gonçalves: Não me sentiria bem comigo próprio se não iniciasse este texto com a referência ao nosso conterrâneo avense (ainda que por adopção) barbaramente assassinado no passado dia 17 de Dezembro. Não se pode dizer que tivesse um relacionamento com ele. Fui apenas várias vezes seu cliente. Toda a vila ficou em choque com o sucedido e com a brutalidade com que foi cometido. As imagens das câmaras de videovigilância percorrem repetidamente a minha consciência. O desabafo é natural: ao ponto que isto chegou! E isto é o que chega ao conhecimento público e vai até às televisões. Mas e o assalto à pessoa, o roubo do carro daquele vizinho, o assalto à residência daquele conhecido. Isto é o dia-a-dia na nossa terra. Nunca como agora, penso eu, houve um sentimento tão grande de insegurança nas Aves. Nem mesmo quando lutamos pela criação de um quartel da GNR na vila. Acredito que a onda de criminalidade tem muito a ver com a crise que grassa na nossa região. O desespero pode levar pessoas a roubar ou a assaltar, mas não há desespero que possa justificar o acto de matar. Se no pequeno delito, a impunidade é quase sempre regra, não quero acreditar que o mesmo se passe com a criminalidade violenta. O que é certo é que mais de um mês se passou sobre o assassinato do Vítor Gonçalves e nada se ouviu sobre detenções. Uma palavra para a coragem da sua esposa que logo após o funeral do marido reabriu a ourivesaria.

Haiti: Em tempos de catástrofe tudo relativizamos. Como comparar a morte de milhares de pessoas aos nossos problemas do dia-a-dia. É impossível. É nestas alturas que devemos dar graças a Deus por termos o que temos. É nestas alturas que percebemos que os milagres acontecem. É um milagre ver alguém soterrado durante oito dias e ao ser libertado cantar e agradecer a Deus por ter sido salvo. Para reflectir...

Referendo: Por estes dias assistimos no nosso Parlamento à aprovação de uma norma que visa permitir o casamento entre duas pessoas do mesmo sexo. No mesmo dia, uma petição com mais de 70 mil assinaturas para realização de um referendo sobre a matéria foi rejeitada. Desta vez, ao contrário da questão do aborto, a maioria dos nossos deputados acharam que estavam legitimados para decidir. Formalmente até estavam, mas ignorar um pedido de 70 mil pessoas evidencia as fragilidades da nossa democracia. Os partidos – tal como ainda recentemente ouvi e escrevi – no seu modelo actual, estão esgotados. A figura da petição perde sentido, bem como a do referendo. Mas este tema concreto, estou certo, ainda vai fazer correr muita tinta.

PT call center
: Na edição de 31 de Dezembro a revista “Vida Económica” titulava numa das suas notícias: “Call center da PT em Santo Tirso só criou 25% dos empregos prometidos”. Com o recrutamente iniciado em meados do ano passado, até agora foram ocupados 300 postos de trabalho, dos 1200 anunciados e usados até como tema de propaganda eleitoral nacional e local. Afinal, parece não haver no concelho desempregados qualificados para as funções exigidas na PT. Só isto já merece profunda reflexão. Na notícia, a PT aponta “um longo prazo” para ocupar os 1200 postos de trabalho, ou seja, atira para as calendas o número anunciado com pompa e circunstância. Sem pessoas em Santo Tirso, a PT equaciona recrutar nos concelhos vizinhos. Que seja, abra-se essa possibilidade.